Passaram, no dia 19 de Março último, 200 anos sobre o falecimento de D. Manuel de Aguiar, 19.º Bispo de Leiria. Para evocar esta efeméride, foi lançado um livro que constitui uma reedição fac-similada da 1.ª edição, datada de 1885 e atribuída a Vitorino da Silva Araújo. Tem por título “Um Bispo Segundo Deus, ou Memórias para a Vida de D. Manuel de Aguiar”, é uma co-edição da editora Textiverso e da Santa Casa da Misericórdia de Leiria, com o apoio do Eng. Ricardo Charters d’Azevedo, e conta com 462 páginas. Destas, 346 correspondem ao livro fac-similado. As restantes são compostas por uma Introdução, por “Uma palavra do Provedor” e ainda por um significativo conjunto de anexos constituídos: por um fac-simile da “Memória Biográfica do Exm.º D. Manuel de Aguiar”, publicada no “Jornal de Coimbra, em 1816; pelo assento de óbito do Prelado; pelo fac-simile da “Oração fúnebre”; por comentários do P. Inácio José de Matos sobre o autor e o seu livro; e pela biografia e outros elementos sobre Vitorino da Silva Araújo.

O lançamento deste livro foi feito no auditório da Santa Casa da Misericórdia de Leiria perante uma plateia de meia centena de pessoas. Na mesa estiveram o editor, Carlos Fernandes, o apresentador, Professor Carlos Guardado da Silva, a Vereadora da Educação da Câmara de Leiria, Dra. Anabela Graça, e o actual Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Leiria, Dr. Fernando Lopes.

 

O apresentador atribuiu especial significado ao título dado ao livro, por considerar «que sintetiza o homem, no seu todo, a criança nascida em Évora, em 8 de Dezembro de 1851, o adolescente entregue aos estudos e visitante assíduo do convento do Carmo e do mosteiro dos cartuxos de Aracelli, o jovem estudante da Faculdade de Teologia da Universidade de Coimbra, o pároco de Santa Cruz do Douro e de São Martinho de Soalhães, o bispo da diocese de Leiria, entre 1790 e 19 de Março de 1815, data em que adormeceria para se encontrar com Deus – pois assim crêem os cristãos, o que explica o cumprimento de Adeus/a Deus, até ao encontro com Deus (...).»

Guardado da Silva evocaria depois a obra do Prelado em Leiria ou a memória que ficou dela:

«A cidade testemunharia e alimentaria muitas memórias da sua ação: a memória da fundação do hospital novo da Misericórdia, construído entre 1798 e 1800, e inaugurado a 4 de agosto deste ano, no sítio da ermida de Nossa Senhora dos Anjos, na margem direita do Lis. Aquando da mudança dos doentes, D. Manuel, com a sua própria carruagem, ajudaria a transportar os doentes; Memória ainda mantida no nome da instituição hospitalar!

«A memória da sua ação enquanto provedor da Santa Casa da Misericórdia, aumentando os rendimentos da instituição e dando-lhe novo regulamento em 1 de Fevereiro de 1800.

«A memória da instalação de um colégio para meninas no recolhimento de Santo Estêvão, com estatutos de 17 de Janeiro de 1803.

«A memória do restauro do seminário diocesano, instalado provisoriamente no Paço Episcopal, no qual instituiu as cadeiras de história eclesiástica, teologia dogmática, teologia moral, instituições canónicas, juntando a cadeira de latim, existente na cidade, e as de retórica e filosofia racional, professadas no convento de Santo António os Capuchos… no mesmo período em que se iniciavam obras de reconstrução do seminário episcopal.

«A memória da construção de um cemitério para evitar os enterramentos nas igrejas e, especialmente, na catedral, como era tradição, antecipando as leis de saúde pública que chegariam quase meio século depois, proibindo a realização de enterramentos dentro das igrejas, e que justificariam em parte a revolta popular da Maria da Fonte contra o governo cartista de Costa Cabral, em 1846. E, uma vez mais, D. Manuel de Aguiar fora o prelado exemplar, criando no cemitério a cripta dos prelados, que acolheria o seu corpo no sono da morte.»

Deve sublinhar-se que D. Manuel de Aguiar era o Bispo de Leiria no período das invasões francesas (1807-1811), tendo sido obrigado a fugir com toda a população no decorrer da terceira. No final da guerra, que deixou a cidade de Leiria e a região completamente arrasadas, o bispo voltou. Guardado da Silva, especialista na história deste período, explicou que a população, na sua maioria fugiu, mas ficaram muitos velhos, inválidos e doentes: «Velhos, inválidos e doentes, muitos deles encontrados sem vida quando as populações regressaram, o que fizeram ao longo de largos meses, a partir de finais de Março de 1811, altura em que D. Manuel de Aguiar acompanha o seu rebanho, antecipando-se a muitas das sua velhas, pois regressou a 30 de Março de 1811, para reconstruir uma diocese em ruínas, carente de pessoas, tanto quanto estas careciam de alimentos, quando uma epidemia ceifava vidas, mais do que a guerra (tifo), sobretudo no Inverno e primavera de 1811.»

Terminaria sublinhando a importância desta reedição e elogiando o esforço dos editores e mecenas: «Dois dias depois de completarem 200 anos da sua morte, as Memórias para a vida de D. Manuel de Aguiar, agora editadas, testemunham a Memória Viva do prelado leiriense na atualidade. Estão pois de parabéns os editores, a Textiverso e a Santa Casa da Misericórdia de Leiria, nas pessoas, respetivamente, do Eng.º Carlos Fernandes, e do Dr. Fernando Lopes, assim como do Eng.º Ricardo Charters d’Azevedo, pelo precioso mecenato, garante da edição, por nos trazerem de novo à estampa esta obra de leitura obrigatória por quem se interessa pela história de Leiria e da sua diocese, pela história da Igreja em Portugal, pela Guerra Peninsular e, particularmente, pela figura de D. Manuel de Aguiar, verdadeiramente ‘um bispo segundo Deus’, expressão que sintetiza de modo feliz a extensa biografia deste bispo de leiriense.»

Encerraram a sessão a Vereadora Dra. Anabela Graça e o Provedor Dr. Fernando Lopes que se regozijaram pela evocação do Prelado com a reedição de tão importante biografia.

(A intervenção do Professor Carlos Guardado da Silva pode ser lida na íntegra em “Apresentações”.)