Por Luís Vieira da Mota
Fundação Caixa Agrícola de Leiria, 12 de Março de 2016
De Pedro Moniz, Pérolas de Vida.
Ou a Pérola do Pedro, ou Pedro, um daqueles diamantes com que, às vezes, topamos na vida?
O Pedro Moniz recorreu aos mais diversos e astutos estratagemas para me convencer a escrever o prefácio deste livro. Não satisfeito com isso, remendou mais alguns pretextos para que fosse também eu a debitar arrazoados no acto da primeira apresentação pública das suas Pérolas. Eu fiquei muito honrado com o principal motivo que o Pedro evocou para me convencer: a amizade. Todas as outras razões que quis somar a essa são supérfluas. Essa basta. No entanto há uma outra, que ele acrescentou, quase em surdina, que me deixou com certa coceira nas orelhas. Perante a minha tentativa de escusa, aconselhando outros mais apropriados, «Quem, disse ele, melhor para prefaciar o meu livro se não o amigo de há muitos anos e pai da Bé.» Aqui a trombeta deu sinal. Mas falso: não encontrei nestas Pérolas do Pedro nenhum soneto que pudesse fazer da Bé uma “espécie de rapariga com brinco de pérola.” Portanto ficámo-nos pela razão principal: a amizade. Razão tão boa que convenceu.
«Tu és Pedro, e sobre essa pedra edificarei a minha Igreja.» Foi assim que Cristo renomeou Simão. E este Pedro, que vós ireis descobrir nas páginas deste livro, é também uma pedra. Genuína, límpida, como o mármore das estátuas quando não precisava de cera para disfarçar as imperfeições: por isso sincero, sem cera.
Vamos então, agora, falar de alguma coisa sobre aquilo, não o que vocês sabem, mas sobre aquilo deste livro que vocês ainda não sabem, mas querem saber, e que julgam, ou pelo menos acreditam, que eu já sei. Se querem que vos diga que neste livro há filosofia? Há (Pág 73)
FILOSOFANDO
Questionaram-me: o que é filosofar?
Fecho os olhos, mergulho no meu ser,
Saboreio o que quero responder
E hipóteses começam a brotar:
Filosofar é querer questionar,
É para o desconhecido correr…
Sem ao fim chegar e na meta ver
Que há outra interrogação a formular.
Filosofar é ter olhos abertos
Aos mil e um segredos que o cosmos guarda,
É tracejar com a razão uma via
Que nos levará para os céus libertos,
Onde a VERDADE em fogo divino arda.
Abro os olhos. É isto a filosofia!
(fim de citação)
E há enleio? Há e muito. Mas escolho, para amostra, este excerto do enleio Filipino da pág 17
«Os teus olhos de suave castanho
São o Mondego, onde em divina aventura,
Nada o cisne da plumagem mais pura,
Qual sereia em mitológico banho.»
(fim de citação)
Contudo, todo o enleio que o autor revela ao longo destas páginas é contido. Não tem arrebatamento porque é doce e fundamentalmente porque é respeitador. Conhecendo-se o Pedro logo se entenderá essa contenção. Para ele, um cântico arrebatado, com outros termos, ou com imagens mais ousadas seria aproximar-se muito das raias da inconveniência. O que lhe seria muito incómodo.
Se quisermos encontrar outro tipo de entusiasmo, teremos de recorrer aos poemas onde ele canta outros amores. E então encontramos o homem de Fé. Porque o Pedro é um homem de Fé e de esperança: Fé em Deus e com Esperança nos homens, donde nascem as orações. E roga, na sua Prece, (Pág. 20)
«Senhor, solicito auxílio!
Da realeza de David,
Sapiência de Salomão,
Fero ímpeto de Sansão,
Concedei somente o mínimo
A quem, humilde, suplica:
Ambiciono ser feliz.»
(fim de citação)
E, para o ser, basta-lhe apenas o mínimo, um quase nada, de cada dom.
Se compararmos os poemas que classifico de enleio com os outros, nomeadamente aqueles que dedica à sua terra, às suas terras, principalmente Barreira, Coimbra e Portalegre, sentimos logo a diferença: nestes não há contenção, porque o autor sabe que nestes cânticos não corre o risco de melindrar nem de se sentir incomodado. Mas onde o Pedro vos há-de parecer mais arrebatado será nos sonetos de cariz patriótico, com focagem muito especial no mundo novo, o da modernidade, que Portugal deu à velha Europa e sem o qual a Europa continuaria velha.
Não se pode, não posso, deixar de realçar o outro tema, nem sei se o mais importante, de todos os deste livro. São os poemas mais simples, mas também os mais ternos. São os poemas onde o Pedro manifesta a sua gratidão por isto ou por aquilo, por tudo ou por nada, às pessoas que foi encontrando na vida, com uma recomendação muito especial pelo quanto têm de ingénuo, sincero e puro, aos versos Idictianos, nas páginas 26 a 28, onde o autor relembra com todo o carinho os seus colegas de trabalho em Portalegre. Para terminar, alinho o seu Soneto da (Pág. 75)
CONVERSÃO
Era uma vez um rapaz inocente,
Perdido em confusão por este mundo:
Tudo o que o seduzia eram, no fundo,
Os tépidos ideais da humana gente.
Um dia sucedeu fatal acidente:
Abismos d‘alma tão e quão profundos,
Plenos de vãos prazeres furibundos,
Dão lugar a algo muito mais premente…
Aquelas truculentas tempestades
De tibieza, amargura e sem razão
São amansadas por brisa muito suave,
Brilham as resplandecentes verdades.
Dou-te, homem divino, a minha mão
E sou mais livre do que qualquer ave.
(fim de citação)
Com o segundo soneto de “Uma ave e o Poeta”, de Teixeira de Pascoaes
E a avezinha, serena e confiada,
Num olhar de ternura me envolveu;
E em sua doce voz iluminada,
E tão cheia de graça, respondeu:
– Meu canto é luz do sol em mim filtrada;
Vou a cantar… e canta d luz do céu.
E das aves da noite a voz cerrada,
É penumbra que nelas se embebeu.
Sonho a perfeita e mística alegria!
Desejo ser a alma da harmonia,
Que toda a terra e todo o espaço inflama!
Quero ser o Infinito e a Eternidade;
Não ser a estrela e ser a claridade;
Ser apenas o Amor, não ser quem ama.
Citado de “As Sombras, A ave e o Poeta, II” de Teixeira de Pascoaes
Edição Círculo de Leitores, (As Sombras, Senhora da Noite, Marânus)
colecção Pequeno Tesouro, pág. 82
Finalmente, em conclusão e com autorização do Pedro Moniz,
SONETO PETRINO
Ao Dr. Pedro Moniz, no dia da apresentação do seu primeiro livro como poeta
Pensei, em tempos, o que eu fui pensar!
Que Pedros só o Moniz e o Santo havia,
Pois nesse tempo só o Moniz lá ia
A casa, como amigo, conversar.
Era tal o calor do seu palrar
Que à mulher disse, ou ela me dizia,
Ainda vamos ver o Pedro, um dia,
Numa “jota” qualquer, a chefiar.
E vimos! Olha o Pedro que já manda
Naquela juventude! E aos abraços
Corremos, aos saltinhos, p’la varanda.
Após zipar na Têvê os quatro espaços,
Ficámos p’ra morrer, de cara à banda:
Afinal havia outro, o Pedro Passos!
Luís Vieira da Mota