Lisboa, 21 de Janeiro de 2011
Este livro de poemas abre com uma epígrafe de três versos do poeta hispânico Luis Cernuda:
«Tú justificas mi existencia
Si no te conozco, no he vivido;
Si muero sin conocerte, no muero, porque no he vivido.»
Belas palavras que, juntamente com o título, “Te quiero”, nos apontam para uma temática de amor.
O primeiro texto, «Conheces-me», em prosa poética, justifica a escolha da epígrafe, sobretudo os últimos dois versos: «Si no te conozco, no he vivido/ si muero sin conocerte, no muero, porque no he vivido.» Traduzindo: «Se não te conhecesse, não teria vivido/ se morresse sem te conhecer, não morreria porque não tinha vivido.»
Da mesma forma, neste texto do autor, «Conheces-me», há uma antecipação do grande amor que iria acontecer, mas que era já pressentido («conheces-me desde sempre, na verdade, ainda não existias e eu já te esperava. E toda a tua vida foi um caminho em minha direcção.»
Depois, é o encontro pleno que o poeta exprime com uma linguagem lírica e simbólica («havia momentos em que sentias um mistério qualquer no mundo e em ti, mas ainda não me vias com clareza. Então um dia apareci-te num poema e tu soubeste que eu sou a água e a luz.»)
No final do texto, esboça-se uma outra prefiguração que está para além da morte, em que o poeta acredita que haverá uma vivência de um amor extraordinário, irreal, transcendente, porque, como ele afirma, «o amor verdadeiro não é deste mundo». Este texto em prosa funciona como uma espécie de introdução à obra no qual se desenham três momentos: 1.º, a espera ou pressentimento que o amor vai chegar; o 2.º, o encontro, a união; e um 3.º momento, o desejo, como uma prece de perpetuação desse amor para além da morte.
O pressentimento de um amor futuro é expresso no poema:
«uma coisa
andava no ar
uma laranja
crescia nas árvores
ainda não sabia
que te amava».
Depois o inesperado:
«e assim o amor não tem explicação
resiste à lógica
às coisas de vidro e ao papel
vem quando vem
sem portas janelas chaves
e cai no coração.»
O poeta eleva esse amor ao sagrado, instituído como uma espécie de oração à Virgem Maria:
«María
llena de gracia y luz
que estás conmigo
todos los dias de mi vida
en las mañanas desamparadas
en los días negros
en las noches de lluvia
pero también
en eses días e noches felices
en que todo parece tan poco
y las mañanas nacen iluminadas
en mi corazón».
A mesma consagração se verifica noutros poemas como:
«fica comigo María
pois as flores estão crescendo
as árvores darão frutos
o nosso amor acontece
no coração
de Deus».
As imagens são oníricas, como se o amor brotasse da terra a explodisse em árvores, flores, frutos, especialmente a mítica laranja, mas também o próprio cosmos com as estrelas do céu e a água da chuva e dos rios.
«rios tranquilos passam
e levam as minhas mãos
torno-me água»
E noutro poema:
«desce sobre mim a tua luz, a tua água, a tua chuva, ajuda-me a ser o teu destino, a tua única verdade, pois tu és a minha explicação.»
A água encerra várias significações simbólicas, das quais as mais dominantes são a fonte da vida, o meio de purificação e centro de regeneração.
As laranjas, que tantas vezes surgem nesta poesia, são símbolo da fecundidade e também da pureza, por isso as noivas costumam levar na cabeça uma coroa de flores de laranjeira. Na China antiga a oferenda de laranjas às meninas significava um pedido de casamento.
«como pode a luz
parecer-se tanto contigo
e depois há as laranjas
onde tocas as tuas mãos iluminadas
inaugurando no mundo um mistério
que só as aves pressentem
e pergunto
como podes ser
uma árvore tão fecunda
e das tuas folhas
água a rosas
e te pareces tanto com a chuva».
O arco-íris, tantas vezes evocado nestes poemas, a caminho a mediação entre o «aqui - em baixo» e o «além - ao alto». É o ponto em que se unem os deuses e os heróis (ou os poetas) entre o outro mundo e o nosso.
«Deus está a fazer novos arco-íris e caminhos
com papeis no coração
é daí que te escrevo».
“Te quiero” é um livro com uma poesia um tanto diferente dos outros livros publicados, mais intimista, todo consagrado ao amor, embora nos restantes livros se verifique a mesma carga lírica, quer falando-se da cidade ou da região que o viu nascer. Igualmente os símbolos míticos ou do sagrado surgem em O livro das pequenas orações, ou em As estações de Deus.
Elsa Rodrigues dos Santos (Presidente da Sociedade da Língua Portuguesa)
Este livro de poemas abre com uma epígrafe de três versos do poeta hispânico Luis Cernuda:
«Tú justificas mi existencia
Si no te conozco, no he vivido;
Si muero sin conocerte, no muero, porque no he vivido.»
Belas palavras que, juntamente com o título, “Te quiero”, nos apontam para uma temática de amor.
O primeiro texto, «Conheces-me», em prosa poética, justifica a escolha da epígrafe, sobretudo os últimos dois versos: «Si no te conozco, no he vivido/ si muero sin conocerte, no muero, porque no he vivido.» Traduzindo: «Se não te conhecesse, não teria vivido/ se morresse sem te conhecer, não morreria porque não tinha vivido.»
Da mesma forma, neste texto do autor, «Conheces-me», há uma antecipação do grande amor que iria acontecer, mas que era já pressentido («conheces-me desde sempre, na verdade, ainda não existias e eu já te esperava. E toda a tua vida foi um caminho em minha direcção.»
Depois, é o encontro pleno que o poeta exprime com uma linguagem lírica e simbólica («havia momentos em que sentias um mistério qualquer no mundo e em ti, mas ainda não me vias com clareza. Então um dia apareci-te num poema e tu soubeste que eu sou a água e a luz.»)
No final do texto, esboça-se uma outra prefiguração que está para além da morte, em que o poeta acredita que haverá uma vivência de um amor extraordinário, irreal, transcendente, porque, como ele afirma, «o amor verdadeiro não é deste mundo». Este texto em prosa funciona como uma espécie de introdução à obra no qual se desenham três momentos: 1.º, a espera ou pressentimento que o amor vai chegar; o 2.º, o encontro, a união; e um 3.º momento, o desejo, como uma prece de perpetuação desse amor para além da morte.
O pressentimento de um amor futuro é expresso no poema:
«uma coisa
andava no ar
uma laranja
crescia nas árvores
ainda não sabia
que te amava».
Depois o inesperado:
«e assim o amor não tem explicação
resiste à lógica
às coisas de vidro e ao papel
vem quando vem
sem portas janelas chaves
e cai no coração.»
O poeta eleva esse amor ao sagrado, instituído como uma espécie de oração à Virgem Maria:
«María
llena de gracia y luz
que estás conmigo
todos los dias de mi vida
en las mañanas desamparadas
en los días negros
en las noches de lluvia
pero también
en eses días e noches felices
en que todo parece tan poco
y las mañanas nacen iluminadas
en mi corazón».
A mesma consagração se verifica noutros poemas como:
«fica comigo María
pois as flores estão crescendo
as árvores darão frutos
o nosso amor acontece
no coração
de Deus».
As imagens são oníricas, como se o amor brotasse da terra a explodisse em árvores, flores, frutos, especialmente a mítica laranja, mas também o próprio cosmos com as estrelas do céu e a água da chuva e dos rios.
«rios tranquilos passam
e levam as minhas mãos
torno-me água»
E noutro poema:
«desce sobre mim a tua luz, a tua água, a tua chuva, ajuda-me a ser o teu destino, a tua única verdade, pois tu és a minha explicação.»
A água encerra várias significações simbólicas, das quais as mais dominantes são a fonte da vida, o meio de purificação e centro de regeneração.
As laranjas, que tantas vezes surgem nesta poesia, são símbolo da fecundidade e também da pureza, por isso as noivas costumam levar na cabeça uma coroa de flores de laranjeira. Na China antiga a oferenda de laranjas às meninas significava um pedido de casamento.
«como pode a luz
parecer-se tanto contigo
e depois há as laranjas
onde tocas as tuas mãos iluminadas
inaugurando no mundo um mistério
que só as aves pressentem
e pergunto
como podes ser
uma árvore tão fecunda
e das tuas folhas
água a rosas
e te pareces tanto com a chuva».
O arco-íris, tantas vezes evocado nestes poemas, a caminho a mediação entre o «aqui - em baixo» e o «além - ao alto». É o ponto em que se unem os deuses e os heróis (ou os poetas) entre o outro mundo e o nosso.
«Deus está a fazer novos arco-íris e caminhos
com papeis no coração
é daí que te escrevo».
“Te quiero” é um livro com uma poesia um tanto diferente dos outros livros publicados, mais intimista, todo consagrado ao amor, embora nos restantes livros se verifique a mesma carga lírica, quer falando-se da cidade ou da região que o viu nascer. Igualmente os símbolos míticos ou do sagrado surgem em O livro das pequenas orações, ou em As estações de Deus.
Elsa Rodrigues dos Santos (Presidente da Sociedade da Língua Portuguesa)